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Puerpério emocional e o alerta para o burnout materno
Se os desafios da gravidez e do parto já são suficientes para desestabilizar o funcionamento de corpo e mente da mulher, imagine a chegada da nova rotina com o bebê agora fora da barriga, somada à adaptação do corpo da mãe para a amamentação, o convívio familiar, a construção da relação com o bebê, a fisiologia e as emoções típicas desse momento?
Se você é mãe ou conhece mães, já sabe que este período que dura de 45 dias a 6 meses é considerado "o período mais intenso da vida de uma mulher". Katherine Sorroche, psicóloga especialista em saúde mental da mulher e parentalidade conhece a causa de perto e, por isso, ressalta a importância de mulheres e a sociedade em geral conhecerem mais não somente o puerpério físico, como também o puerpério emocional que pode acompanhar a nova mãe nos primeiros meses de vida do bebê.
"É sabido que o puerpério é aquela fase em que parece que você nunca mais vai dormir de novo, que você não tem mais vida, é a fase em que os bebês choram demais e ainda tem a 'hora da bruxa', a pior hora do dia", situa a especialista.
O puerpério físico, então, compreende toda a adaptação de mãe e bebê à vida juntos, em que o corpo da mulher está se adaptando muito rapidamente aos desafios da amamentação, com os hormônios trabalhando intensamente, em função de fazer esse corpo entender que o bebê já nasceu e precisa do cuidado da mãe.
"Conhecido como período de resguardo, esse período dura em torno de 45 dias e é caracterizado pelos desafios de um corpo que está fisiologicamente estressado, com déficit de nutrientes após uma gestação e um parto, se adaptando à nova vida", resume a Katherine.
Puerpério Emocional
"Mas não é só fisiologicamente que há necessidade de um resguardo.
Emocionalmente, essa mulher ainda está se encontrando nessa nova dinâmica familiar. Os desafios da amamentação, a privação de sono, o choro do bebê, a nova rotina que se estabelece, a falta de ajuda, ou o excesso de palpites, tudo isso traz uma demanda psicológica de adaptação", explica a psicóloga.
Segundo ela, esse é o puerpério emocional, ou seja, o período de adaptação emocional e psicológica à maternidade, pode durar até os dois anos de idade da criança, podendo se estender até três anos, caso essa mulher não tenha suporte profissional adequado para compreender e elaborar todas essas mudanças e, de fato, se adaptar à maternidade.
"Tornar-se mãe é um processo que mobiliza emoções muito profundas, principalmente a depender do contexto social, financeiro, conjugal e estrutural que essa mulher está inserida. Tudo muda: a dinâmica da casa, a relação do casal, muitas vezes a renda, a vida social, entre outros", contextualiza a especialista, ao adicionar que, a partir dessas possibilidades, podem surgir questões como depressão perinatal, transtornos de ansiedade, transtornos de humor e ainda outros transtornos, conforme as dificuldades enfrentadas por essa nova mãe.
Sinais do Puerpério Emocional
Retraimento social
"Até seis meses após o parto, mãe e bebê estão se vinculando e se conhecendo. Então é natural que surjam muitas preocupações relacionadas ao bebê, angústia em ficar sozinha com o bebê ou muito tempo longe dele. Nessa fase, também pode haver uma necessidade maior de recolhimento", indica a terapeuta.
Emoções mexidas
Chorar sem motivo, tristeza súbita, introversão, maior irritabilidade e cansaço também são sintomas esperados nos primeiros 30 dias, segundo a Katherine. "Se ultrapassarem este período e forem muito intensos e frequentes, é preciso buscar ajuda", orienta.
Dúvidas sobre si mesma
Segundo a psicóloga, a partir dos seis meses do bebê, a vida já começa a ficar um pouco mais estável em relação aos cuidados com ele. É quando, então, a mulher começa a se voltar mais para si mesma. "Em geral, ela começa a buscar mais espaços internos para seu autocuidado físico e emocional - volta a trabalhar, muda o estilo de se vestir, retoma a vida social, retoma a vida conjugal, busca tempo para si", descreve. É nesse período que Katherine aponta a possível aparição de conflitos internos a respeito da própria identidade da mulher, sua missão e propósito de vida.
Também entram aí os questionamentos sobre o futuro, como: "Que mãe eu quero ser no futuro?", "Que família eu quero ter?", "Que mundo eu quero ajudar a construir para os meus filhos?", "O que eu quero para minha vida e para a vida dele?", "Quem sou eu agora?".
Demora ao recuperar a identidade pessoal
O movimento contrário também pode surgir, segundo Katherine. "É bastante comum que a mulher sinta angústia, ansiedade, o peso da maternidade, medo, dificuldade em se reconhecer e retomar a própria vida. Esse é um sinal claro de que essa mulher precisa de ajuda para se ver além da mãe que ela está se tornando", alerta a especialista.
Como passar bem pelo puerpério emocional?
Diante desses possíveis quadros, Katherine ressalta que a adaptação à maternidade vai muito além de um corpo que precisa voltar ao lugar. "A todo momento, desde a concepção, a descoberta da gestação, a gravidez, o parto, a amamentação, o pós-parto, estão sendo mobilizadas questões da história de vida dessa mãe, sua infância, seus traumas, a relação com os próprios pais. Tudo isso passa a ser refletido após o nascimento dos filhos e permeia a relação que está sendo construída com eles", explica ela.
Ela reconhece que os tempos atuais estão mais permeados de informações e o próprio reconhecimento dessa situação faz com que seja possível atravessá-lo de forma mais consciente.
Por essa razão, Katherine indica que a mulher busque por assistência psicológica durante a gestação, o parto e o puerpério, se possível, já que é uma forma objetiva tanto para o diagnóstico, manejo e tratamento de transtornos perinatais (como depressão gestacional, depressão pós-parto e transtorno de ansiedade, burnout), como também para ajudar na prevenção destes e outros transtornos.
"Ainda que não haja a presença de um transtorno efetivamente, receber educação e informação acerca do puerpério fisiológico e do puerpério emocional, da mudança de vida após a chegada do bebê e ter informação a respeito das necessidades fisiológicas, psicológicas e afetivas do bebê certamente contribuem e muito para que essa mulher atravesse o puerpério de forma mais segura e confiante", argumenta.